Keepsakes

Mania estranha essa de ler um texto sem prestar a devida atenção, apenas sobrevoando as palavras sem jamais pousar numa ideia. Nada mais dispersivo, eu diria. Mas é esse tipo de leitura que me vejo fazendo frequentemente.

Gosto de ler textos em inglês. Uma meia dúzia de professores de inglês que tive ou conheci me disse que não há melhor forma de adquirir vocabulário do que lendo. Ah, na verdade, tem: estudando. Enfim, além de estudar, ler diversos textos é de grande ajuda.

Pois bem, numa dessas leituras exploratórias pelas íngremes colinas da língua inglesa, numa escarpa rebuscada e pedregosa que era o quinto parágrafo de um artigo do The Guardian, deparei-me com a formosa palavra keepsake. Soa bem, não? Keepsake. Já me perguntei em que contexto esse termo se encontrava, mas não consigo me lembrar. Nem tentei procurar, também. Alguns mistérios são tão indeléveis quanto insolúveis.

Keepsakes são objetos (pequenos) mantidos com o propósito de que seu portador se lembre de alguém ou alguma coisa. Simples assim. Ao ler o termo, a primeira sensação foi de querer traduzi-lo, mas é evidente que não há tradução exata para o português. Passado um momento, meu segundo intento foi pensar nos meus keepsakes. Quem não pensaria?

Cada um tem os seus: anéis, fotos, bilhetes, pedaços de coisa quebrada, flores ou folhas secas mantidas em livros, o que for. Mas, afinal, de que valem essas memórias transfiguradas, esses pedaços de saudade? Mantemos perto o que não suportamos distante. Mantemos os espólios como se fôssemos os vencedores. Enganamos a mente pra aliviar o coração. Mentimos à verdade. Enquanto buscamos nos agarrar, nos ater ao que não há, nossos keepsakes desvanecem entre os dedos como areia fina.

Nem tudo precisa de um nome, e nem tudo que é nomeado o foi de acordo com nossa vontade ou gosto. Sendo assim, cada objeto que ficou vai ser rebatizado, graças à essa minha curiosidade literária ou falta de atenção. Ou, até mesmo, graças aos professores de inglês que conheci. Enfim, já não importa.

Nos esconderijos que inventei, ainda é possível encontrar as imperecíveis evidências da ausência. Provas que não provam nada além da minha força. Indisposição a aceitar o que não volta traduzida em pequenezas físicas. Keepsakes. É tudo que são. E são tudo.

A recomedação de hoje é “Shooting Stars” do cantor Edwin McCain.

Autodestruição

Estudo coreano. Minha professora é nativa. Quando falamos sobre diferenças entre Coreia e Brasil, uma das primeiras mencionadas por ela é a disciplina. Ela conta que aqui sentamos de qualquer jeito nas cadeiras, que não fazemos lição, que não nos atemos muito aos horários, que não há muito respeito pelos professores.

Claro que esse relato não se refere à aula dela, mas é mais que verídico. “Aqui” (no Brasil), não estranhamos alguém chegar sempre meia hora atrasado à aula ou erguer o tom de voz a um professor – com ou sem motivo.

Nossa cultura “educacional” apaga a luz na hora de aprender e só a reacende ao soar do sinal. Raros são os alunos que se interessam em se empenhar – mesmo os de ensino superior.

Além da falta de interesse, há algo muito curioso incutido no cérebro do brasileiro (de qualquer faixa etária) de forma geral: a ideia de que o professor é inimigo. Cansei de ver gente desafiando professores (e eu mesmo, sem dúvida, mas – hoje – com vergonha, já o fiz) como se fossem inquisidores ou comensais da morte. No fundo, não faz o menor sentido. Ele ou ela está lá para ensinar, ajudar e verificar o aprendizado; com o sinal, sua missão está cumprida. Há algum motivo para ódio, desrespeito e postura desafiadora nesse breve ínterim? A resposta me parece bastante óbvia.

Sim, há porfessores horríveis, insuportáveis e quiçá prepontentes – mas estes seguramente são minoria. O que não pode acontecer é o aluno ir à escola com espada em punho, pronto para desafiar o “poder” do professor. É algo contraditório: sem quem ensine, nunca se aprenderá. Não querer ser ensinado é condenar a si mesmo às trevas sendo livre para permanecer à luz do conhecimento. Que cessem fogo contra os mestres.

Música de hoje: “What I’ve Done”, do Linkin Park.

Dias de chuva

Quando você é útil, gentil, carinhoso(a), educado(a), companheiro(a), todos acham isso muito agradável e lhe avaliam da melhor maneira possível; são sorrisos, abraços, risadas e companhia que parecem incondicionais e sem data de validade.

Agora… Experimente passar cinco minutos cabisbaixo(a), triste, cansado(a) (situações normais, pelas quais todos passam) e veja qual a reação das pessoas em seu redor. Tire suas conclusões.

Fim

E se algum conhecido, familiar ou amigo morresse hoje, indo para o trabalho, para a aula, ou  na volta para casa, ao atravessar a rua, ao parar por um instante… E se acontecesse? Você teria dado um último aperto de mãos? Você estaria pronto para simplesmente continuar, fingindo que nada aconteceu? Ou cairia em prantos eternos? Como você se lembraria dessa pessoa?

E se fosse você? Como você gostaria de que se lembrassem de você? Você, se partisse na próxima hora, teria deixado o quê para trás? Porque, claro, não se leva nada da vida, então, tudo o que fazemos e temos fica para trás. Qual seria, então, o seu legado? Inimigos ou amigos? Sucesso ou falhas? Irredutibilidade ou aprendizado? Humildade ou aparência? Claro, não sejamos maniqueístas… Todos nós deixaremos um pouco de cada; mas o ponto é: qual seria a  marca, qual teria sido o impacto da sua, da minha vida?

Enfim, se alguém morresse hoje, você provavelmente seria pego de surpresa. Normal. Evidente; ninguém se prepara para a morte. Mas, ironicamente, ela é a única certeza universal. Você daria um abraço bem apertado se soubesse que aquela discussão eram os últimos minutos da outra pessoa com você? Você seria mais amável se soubesse que aquela situação era a última? Você sorriria se soubesse que aquela seria a última imagem – para você ou para alguém?

Você trocaria de lugar? Você viveria melhor, mais? Você se arrependeria de mais coisas? Mudaria o curso das suas escolhas? Ensinaria mais? Seria mais tolerante? Seria menos resistente? Observaria mais? Ouviria mais? Seguiria a voz do seu coração ou a voz das pessoas?

A música deste post é “If Today Was Your Last Day”, do Nickelback.