Ligação

E se o futuro se recusar a me dar a mão mais uma vez, uma vezinha, eu vou sem ele. Ah, não. Não dá. Não consigo ficar esperando por ele enquanto tem tanta coisa me esperando também. Sou ocupado, ambicioso, tenho pouco tempo! Alguns dizem que sou teimoso; outros, impaciente. Mas a verdade é que dei um ultimato ao meu futuro. Ele não vai se recusar a me dar a mão novamente.

Enquanto o passado tenta me implicar em histórias mil, coisas inacabadas ou incompletas, tão rotas quanto um navio no fundo do mar, eu chamei o futuro pra uma conversa. É. O passado é cheio de histórias pra contar, e gosto de muitas. Aliás, gostaria de reviver algumas. Mas eu me interesso mesmo pelo futuro. Tenho uma quedinha por ele. , tenho um tropeço por ele. Quem não tem?

Sim, o futuro tem muito o que aprender. Alguém como eu, humilde em minha limitação, sabe bem disso. Sempre aprendemos. Mas, enfim, como ia dizendo, o futuro é bacana justamente por ser uma folha em branco: ele é um grande ouvinte. Adoro grandes ouvintes. Parecem sempre entender tudo.

Mas… O futuro é estranho, por outro lado. Ele é meio inseguro, incerto… Não tem certeza de nada. Nosso papo se resumiu em três partes: a minha fala, a atenção dele, e as incertezas que ele tem. Juro, se não gostasse tanto dele, teria me levantado e saído sem nem olhar para trás – digo, para a frente.

Bom, no fim… Nos acertamos. Pelo menos é o que eu sei, porque, no que depender dele, xi… O futuro é complicado mesmo. Confesso que a cada dia o entendo mais, mas ele parece não me corresponder. Sempre que eu olho pro futuro, tem aquela interrogação enorme sentada sobre as minhas ideias e planos. Que coisa!

Amanhã, mesmo, a gente vai se ver de novo. Vai ser outro papo inconclusivo e o de sempre, lá, vai me ligar querendo marcar um flashback. Ah… Vou ser sincero, tem muita coisa que eu adoro ou adoraria reviver. É sempre bom. Mas meu negócio firme, meu caso sério começa amanhã. Como sempre, e para sempre. Não consigo tirar mais os meus olhos do futuro, é quase aquele sentimento de um amor à primeira vista.

Prazer, eu sou o hoje.

A música deste post é “If You Ever Come Back”, do The Script.

Um mais um é sempre um

Algumas coisas simplesmente acontecem; o resto, a gente tenta explicar. Tudo só é natural quando é inesperado; a natureza é desprovida de intenções. O “sem querer” é a vontade do acaso; o “de repente” é o vício da verdade. O sorriso franco e largo não tem receita; não há felicidade gêmea, já que a felicidade estará sempre no um, na união. O desconhecido é o roteiro da vontade; o conhecido é o rastro da saudade.  A afinidade é o portão do coração; as carícias são meras passagens secretas subterrâneas inseguras. A verdade é o meio que leva a conquistar; o abraço é uma mão de verniz na conquista. A incerteza é a certeza da esperança; esperança é o final do inverno do amor. O desejo é o gerador de coincidências; a coincidência é só a prova final aplicada pelo destino.

A música do dia é “Save Yourself”, do James Morrison.

A água

O ritmo dos pingos
Ao cair no chão
Só me deixa relembrar
Tomara que eu não fique
A esperar em vão
Por ela que me faz chorar
Oh, chuva traga o meu amor
(“O ritmo da chuva”; composição de Peninha)

Será que alguma coisa,
Nisso tudo, faz sentido?
A vida é sempre um risco,
Eu tenho medo.

Lágrimas e chuva
Molham o vidro da janela
Mas ninguém me vê
(“Lágrimas e chuva”, do Kid Abelha)

Chovendo, lá fora. Sim, muita gente acha ruim e fica emburrada por não poder sair ou ter sua capacidade de locomoção reduzida. Tirando essa parcela boba da população, sobram os admiradores da chuva, a quem dedico esta postagem.

Um dos erros na observação é perguntar direta e precipitadamente “o que é” antes de entender como as coisas acontecem, quando, onde ou seus porquês. Ora, a chuva nada mais é que água. E para que serve a água? Não é para apagar o incêndio, lavar o que está sujo, aumentar a correnteza do rio? A água nem sempre cai quando é necessária lá fora, na natureza, no mundo. Às vezes ela cai para que apaguemos o fogo do desconforto ou da ansiedade, lá dentro. Talvez ela caia para nos mostrar que a paciência é uma das maiores virtudes ou para exemplificar a renovação diária, ao cair no rio e fazer suas águas se moverem adiante.

Há pouco, li um texto de um amigo que dizia que o mar fala. Pois bem, a chuva, não; mas é uma grande ouvinte. O melhor ouvinte é aquele que não fala, que não interrompe; que apenas se manifesta quando, respeitosamente, já prestou atenção ao que estava sendo falado. A chuva é assim. Sente-se próximo a uma porta ou janela, deixe apenas o vidro fechado. Comece a falar, mesmo que com o pensamento. Ela vai continuar lá, impávida.

Contudo, fuja de conversas com as chuvas de verão: elas vêm e vão com tamanha rapidez que não são confiáveis; podem levar seu segredo embora sem nem se despedir, deixando algo sujo a ser lavado ou uma chama ainda acesa.

Sentar-se ao som da chuva não tem a ver com religião ou sentimentalismo. Tem a ver com você. Quem você é (ou não) fica refletido pela abnegação dos pingos que caem, sempre ali, no mesmo lugar, perto de você. A chuva parece só sua, parece estar ali exclusivamente para você. Mas não é bem assim; alguém uma vez disse que ela cai para todos. Erros, lembranças, acertos, perspectivas – tudo flui nesse rio vertical que uns chamam de chuva, outros, de vida.

A música deste post é Sleep, da banda finlandesa “Poets Of The Fall”.