Ditadores da atualidade – parte 3

E se é um déspota que pretendeis destronar,
verificai primeiro se seu trono erguido dentro de vós está destruído

(Kahlil Gibran)

No post de hoje, você verá os ditadores com mais de três décadas de governo nas costas. Eu, que tenho dezoito anos, hoje, não chego a ter metade da idade do “mandato” de alguns desta lista.

Hosni Mubarak (Egito) – 1981-2011
Como este é um dos nomes mais buscados no Google em 2011, creio haver conteúdo bastante em outras fontes. Limito-me a dar informações breves. De novembro de 1954 a fevereiro de 2011, o Egito teve apenas três presidentes. O primeiro deles, Gamal Abdel Nasser, governou até sua morte, em 1970, ano em que assumiu seu “preferido” para o cargo, Anwar El Sadat. Este foi assassinado em 1981 e Mubarak chegou ao poder. Após três décadas de domínio, Mubarak ruiu com as manifestações pró-democracia. Li em um texto do The New York Review Of Books que havia uma piada, no Egito, que perdeu seu propósito após a queda de Hosni Mubarak. Ela dizia que Nasser, um idiota, procurou por alguém mais idiota que ele para ter como sucessor caso fosse necessário; e achou Sadat. Anwar El Sadat, por sua vez, procurou alguém ainda mais idiota para que pudesse ser seu sucessor, até encontrar Mubarak. E Mubarak? Bem, ele ainda estava procurando. Até ser derrubado. Aliás, Mubarak tem mesmo vocação para ditador, não acha? Essa carinha gorda lembra tanto Jabba the Hut, da saga Star Wars…

Robert Mugabe (Zimbábue) – 1980
Referência quando o assunto é ditadura, Mugabe é provavelmente o mais idoso desta lista – os leitores que me perdoem, mas não chequei a idade de todos -, com 87 anos. Tem o mesmo perfil de Fidel Castro – de quem falaremos logo abaixo: tem formação universitária, foi guerrilheiro, passou anos preso, libertou seu país, etc. Mas tudo um dia acaba. Ou não, se o assunto for Robert Mugabe no Zimbábue. Um marxista dos tempos da URSS, ocupou o cargo de primeiro-ministro zimbabuano a partir de 1980, quando, em acordo no Reino Unido, conseguiu a independência de seu país. Foi eleito presidente em 1984… E depois, em 1990, 1996, 2002 e 2008 (ufa!) venceu eleições igualmente fraudulentas.

Rico em jazidas de diamante, o Zimbábue figura na 143ª posição do ranking de mortalidade infantil da ONU. A expectativa de vida é de quase 44 anos. Mais de três milhões de zimbabuanos fugiram para a vizinha África do Sul, em busca de melhores condições de vida, após o agravamento da crise econômica no país, em 2010, quando o desemprego chegou a assombrosos 95%. O Zimbábue é o último colocado no ranking de IDH, o Índice de Desenvolvimento Humano, medição feita em 169 países. Atualmente, a inflação no país é a maior do mundo, atingindo inacreditáveis 169.000% – mas já chegou a ultrapassar os 1.000.000% anuais, em 2008. Em 2009, Mugabe formou uma coalizão com o primeiro-ministro, Morgan Tsvangirai, mantendo, assim, seu domínio político enquanto trata de suas enfermidades em modernas clínicas no Cingapura.

José Eduardo dos Santos (Angola) – 1979
Chefe das Forças Armadas Angolanas e presidente do partido Movimento Popular pela Libertação de Angola, dos Santos é o segundo presidente da curta história independente de Angola, que começou em 1975. José Eduardo dos Santos era uma figura eminente no cenário político local mesmo antes de assumir a presidência, em 1979, após a morte de seu antecessor, Agostinho Neto. Aliás, olha só com o chefe de que país foi fotografado em 2003…

Em 1992, dos Santos conseguiu 49,5% dos votos, em primeiro turno, o que levou a disputa a segundo turno. O melhor candidato da oposição, Jonas Savimbi, que havia conquistado pouco mais de 40% do eleitorado, simplesmente desistiu da disputa, alegando que não seria possível realizar eleições por trás das quais houvesse fraude. Desde 2001, dos Santos acena com novas eleições, promessas de desenvolvimento de seu governo altamente corrupto e repressivo (especialmente com a imprensa), mas seu partido – o MPLA – sempre consegue um “jeitinho” de evitar o pleito. Em 2010, o MPLA, absoluta maioria no Parlamento, aprovou emenda que garante a eleição presidencial indireta. Ora, se dos Santos é do partido de maioria no Parlamento… Angola está entre os dez piores países em índices de transparência governamental e corrupção e também no top10 negativo de desenvolvimento humano.

Teodoro Obiang (Guiné Equatorial) – 1979
Um dos ditadores mais descarados, Obiang voltou a ser notícia, há duas semanas, quando um de seus filhos encomendou um iate a uma empresa alemã. Até aí, não haveria mesmo problema, afinal, o país africano não produz tal mercadoria… Quer dizer, não haveria se a embarcação não custasse US$380 milhões – mais de 1,7% do PIB da pequena Guiné Equatorial (a assessoria do governo assegurou, após vazamento do episódio, que Teodorin Obiang, o “filho do chefe”, havia mudado de ideia acerca da aquisição).

Em 1979, Obiang chegou ao poder após, em golpe de Estado, assassinar seu antecessor, seu tio, o genocida Francisco Macías. Eleições para o mandato de sete anos foram agendadas para 1982, as quais ele venceu. Em 1989, reelegeu-se, uma vez que era o único candidato. A partir de 1996, outros partidos foram finalmente legalizados e, nas eleições daquele ano e, novamente em 2002, Teodoro Obiang foi reeleito com 98% dos votos. Mais tarde, em 2009, recebeu 97% dos votos e permanece no comando de um dos mais corruptos – senão o mais -, opressivos e antidemocráticos países do mundo. Em 2008, adquiriu o poder de governar por decreto – algo com o que a atual presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, andou sonhando, logo no começo de seu mandato. Aliás, falando em presidentes do Brasil…

Ali Saleh (Iêmen) – 1978
Antes que algum leitor mais especializado em Oriente Médio conteste a data de 1978, dizendo que o Iêmen, tal como é hoje, se constituiu apenas em 1990, eu explico: Ali Abdullah Saleh foi presidente do Iêmen do Norte de 1978 a 1990, data da unificação, que o manteve no cargo. Tenente do exército norte-iemenita, Saleh chegou ao poder após o assassinato do então presidente Ibrahim al-Hamdi. Foi reeleito como presidente do Iêmen do Norte em 1983. Ali Saleh e seu partido saíram vitoriosos em 1993, na primeira eleição após a unificação do país, mas o Partido Socialista contestou os resultados do pleito, provocando conflitos internos. Em 1999, reelegeu-se com mais de 91% dos votos. Em 2006, prometeu não concorrer, pois era hora de treinar a juventude, segundo suas próprias palavras. Mas, num ato de pura malandragem, mudou de ideia, concorreu e venceu em primeiro turno, com quase três quartos do eleitorado a seu favor. Confrontado com protestos em seu país desde o final de 2010, Saleh ainda balança. Mas não cai.

Khalifa Al Khalifa (Barein) – 1971
O Barein é um paraíso para muitos, assim como o são outros prósperos celeiros petrolíferos do Golfo Pérsico, como os Emirados Árabes Unidos ou o Catar. Mas nem tudo são flores quando o primeiro-ministro (Khalifa bin Salman Al Khalifa) ocupa o cargo há quatro décadas. E mais: o rei do Barein, Hamad Al Khalifa – assim como o primeiro-ministro -, são sunitas. E a maioria bareinita pertence ao xiismo, a ala mais radical do Islã. Traduzindo… São membros da minoria comandando a maioria. Óbvio, isso não acabaria bem.

Al Khalifa foi apontado como primeiro-ministro em 1971, por seu irmão, Isa bin Salman Al Khalifa – o então rei do Barein. Seu poder nunca foi questionado, uma vez que é membro da família real, sendo tio do atual rei, Hamad bin Isa Al Khalifa. O Barein, que outrora fora província da Pérsia – atualmente, Irã -, e tem a composição religiosa de sua população semelhante ao Irã, com maioria xiita, pode estar com os dias de sua monarquia contados.

Muammar Khadafi (Líbia) – 1969
Certamente o mais bizarro de todos, Khadafi anda especialmente famoso. Com a iminência de sua possível queda, seu país tem ocupado todo caderno de notícias internacionais. Khadafi é um líder militar que, após tomar o poder através de golpe, foi sábio para prevenir-se contra possíveis golpistas, diminuindo os poderes das forças armadas líbias. Criou também a chamada “Jamahyria”, termo usado para designar as espécies de “divisões regionais” ou “comitês populares” do país; Khadafi se orgulha desse sistema – apesar de a Líbia não ter uma Constituição, por exemplo – e o chama de democrático.

A gestão Khadafi, especialmente nos anos 1970 e 1990, foi inexoravelmente relacionada com atos terroristas. Entre 1992 e 1999 a Líbia esteve sob sanções econômicas impostas pela ONU. A partir dos anos 2000, Khadafi resolveu bancar o bonzinho e entregou ao Ocidente alguns terroristas que “prendera” em seu território. Mas, apesar de haver algo de muito absurdo em um líder que está há mais de 40 anos no poder, ao menos Khadafi consegue dançar conforme a música das grandes petrolíferas estadunidenses e britânicas – e a recíproca também é verdadeira, quando o líbio se irrita com alguma coisa. Aliás, a irritação de Muammar Khadafi é algo singular: há alguns anos, em encontro da ONU de chefes de Estado, realizado em Nova Iorque, ele recusou hotéis de luxo, alegando preferir acampar com sua tenda no Central Park (mas, em face a tal estranheza, há de se considerar que ele escapou de um atentado enquanto estava em um prédio, episódio que lhe gerou tal fobia); como seu pedido foi obviamente recusado, Khadafi largou um punhado de urânio, desprotegido, na pista do aeroporto de Nova Iorque, para a loucura dos agentes estadunidenses.

Perpetrando-se com violência, repressão, e várias pitadas de bizarrice, Khadafi é o ditador mais enigmático de todos.

Os irmãos Castro(Cuba) – 1959
Um dos poucos ditadores que não se valeram de eleições, o advogado Fidel Castro comandou Cuba de 1959 a 2008. Sim, uma pesquisa rasa constatará que Fidel ocupou, logo após a marcha sobre Havana, em 1º de janeiro de 1959, o cargo de comandante-em-chefe de todas as Forças Armadas e também o cargo de primeiro-ministro. Por mais mirabolante e inacreditável que pareça, Fidel, Che, Dorticós e seus revolucionários retiraram um ditador do poder, antes de instaurar o mais duradouro regime (intitulado de) comunista nas Américas. Sim, antes de Fidel, a realidade cubana, por sete anos, havia sido a ditadura de Fulgencio Batista.

Apesar das palavras “Fidel Castro” e “Cuba” trazerem à mente um militar fardado e barbudo, de charuto na boca, exalando comunismo, o patrimônio da família Castro foi estimado em mais de meio bilhão de dólares, em 2005. Após muito tempo de governo à frente do país que virtualmente erradicou a AIDS e o analfabetismo de sua população e é referência em estudos médicos, Fidel, devido a problemas de saúde, foi obrigado a delegar o poder ao irmão, Raúl, em 2008. Raúl Castro tem dado continuidade ao regime do irmão mais velho e não há perspectiva de abandono da revolución mais idosa da atualidade, com 52 anos. Mas não sejamos românticos em demasia com relação à ilha caribenha: Cuba também é palco de repressão, censura…

Abaixo, mapa com os países dos ditadores de todos os três posts da série. Em preto, assinalados os países dos ditadores mencionados neste post.

A música de hoje é “Imagine”, do lendário John Lennon.

Ditadores da atualidade – parte 2

Sem demorar, vamos ao que interessa: os ditadores – que começaram mais um ano na ativa – e que respondem pelo cargo máximo de líder de seus respectivos países há mais de 20 anos e há menos de 30. Vamos a eles.

Islam Karimov (Uzbequistão) – 1990
Talvez o primeiro de nossa lista a já ter contado com apoio dos EUA, Karimov assumiu a presidência legalmente em 1990, quando o país ainda integrava a esfacelante União Soviética (que viria a se desfazer completamente no fim do ano seguinte). Reelegeu-se com invejáveis 91,9% nas eleições de 1995, contando inclusive com o voto do candidato da oposição, Abdulhafiz Jalalov, que, implicitamente, reconhecera a impossibilidade de derrotar o atual presidente.

Nas eleições seguintes, foi reeleito e, com mandato começando em 2001 – ano dos atentados terroristas de 11 de Setembro nos EUA – o Uzbequistão de Karimov, fronteiriço ao Afeganistão, considerado base-mor da Al Qaeda e outros grupos terroritas à época – tornou-se um local ideal para a instalação de bases militares dos EUA. Porém, as relações entre Estados Unidos e Uzbequistão se esfriaram em 2005, quando o governo uzbeque abriu fogo contra manifestantes na cidade de Andijan, matando ao menos 1.500 pessoas. Após tal evento, os EUA repreenderam o governo de Karimov, que, em represália, ordenou a retirada das tropas ianques de seu território naquele mesmo ano. Karimov ainda conseguiu a clássica emenda (in)constitucional para que pudesse concorrer novamente às eleições de 2007, que venceu com mais de 90%. Aliás, na foto acima, percebe-se que não é apenas com ditadores como Fidel Castro (sobre quem falaremos depois), Hugo Chávez ou Abdoulaye Wade, por exemplo, que o governo brasileiro gosta de ser relacionado, em fotos.

Omar Al-Bashir (Sudão) – 1989
Mesmo não estando há tanto tempo quanto outros ditadores terríveis, como o zimbabuano Robert Mugabe ou o líbio Muamar Kadafi, Omar Al-Bashir é um dos maiores genocidas da história. O Tribunal Penal Internacional (TPI) o acusa de comandar ataques à região centro-oeste sudanesa de Darfur, que resultaram em um número de mortos entre duzentos e quatrocentos mil. O TPI, além de genocídio, o acusa também de crimes contra a humanidade, crimes de guerra e corrupção que teria lhe rendido mais de nove bilhões de dólares. A gestão de Al-Bashir presenciou a chamada Segunda Guerra Civil Sudanesa.

Após sucessivas – e típicas – vitórias eleitorais, em 2010 Al-Bashir concorreu sob uma circunstância peculiar: foi a primeira vez que um candidato à presidência do Sudão com mandado prisão emitido pelo TPI concorreu e foi eleito (com 68% dos votos). Aliás, a presidência é um cargo por ele criado, quando era primeiro-ministro. Omar Al-Bashir indicou a si mesmo como primeiro presidente sudanês e desde então tem comandado o décimo maior país do mundo em área. Contudo, de alguma forma, seu domínio está com os dias contados, pois em fevereiro de 2011, um referendo, que versava sobre a divisão do Sudão em pelo menos dois novos Estados, teve larga aceitação popular e deve-se proceder à divisão do território nos próximos anos. O Sudão conta com várias milícias islâmicas e grupos terroristas em seu território, que geralmente entram em conflito com as minorias cristãs sudanesas.

Zine Ben Ali (Tunísia) – 1987-2011
Ben Ali foi o estopim das revoltas árabes de 2011, tendo sido o primeiro líder a cair. Revoltas dos tunisianos, começadas no final de 2010, culminaram no exílio do ex-presidente da Tunísia. Agora faltam apenas as reformas econômicas que a população busca. O general (mais um militar…) Ben Ali chegou ao poder, em 1987, após substituir o já debilitado Habib Bourguiba, revolucionário que lutou pela independência tunisiana desde a década de 1950, que foi eleito presidente vitalício em 1957, um ano após a independência da França.

No comando desde então, Ben Ali foi reeleito em 1994, com nada mais, nada menos que 100% dos votos (houve abstenção de 5%). O líder tunisiano seguiu se reelegendo, alterando a idade máxima para os presidenciáveis, de modo a poder concorrer por mais tempo. Nesse ínterim, a Tunísia passou a ser vista como local de violação dos direitos humanos e da perseguição à imprensa. Em 2009, foi reeleito pela quinta vez com 89%, em um Estado onde o desemprego era gritante. Tão gritante que, em 14 de janeiro de 2011, os gritos se fizeram ouvir e Ben Ali partiu para seu exílio na Arábia Saudita.

Blaise Compaoré (Burkina Faso) – 1987
Compaoré é um dos poucos ditadores africanos que assassinou seu antecessor para assumir o cargo. Mesmo homens de mão de ferro, como Ben Ali e Al-Bashir, tomaram o poder em golpes sem derramamento de sangue. Poucos ditadores não são contraditórios com relação aos nomes de seus partidos, movimentos ou entidades; Compaoré é um bom exemplo: pertence ao Congresso por Democracia e Progresso. Seu país, Burkina Faso, sem saída para o mar, é o 161º no ranking de IDH, e figura entre os últimos também no de renda per capita.

Compaoré assumiu o poder, como mencionado, ao assassinar – segundo suas palavras, tudo não passou de mero “acidente” – seu antecessor, Thomas Sankara, em 1987. Até 1989, Burkina Faso foi comandada por um governo trino, composto por Compaoré e dois de seus “mais chegados”, o capitão Henri Zongo e o Major Lingani. A sede de poder do líder burquinense o levou a mandar prender ambos, sob acusação de traição. Zongo e Lingani foram sumariamente executados. Compaoré foi eleito presidente em 1991, em uma eleição onde a abstenção foi de 75%, e, em 1998, reeleito. Em 2005 (o mandato em Burkina Faso era de 7 anos até então), Compaoré contrariou a oposição, se candidatou e venceu com mais de 80% dos votos.

Rei Mswati III (Suazilândia) – 1986
Um dos últimos redutos do absolutismo – em pleno século XXI! – a Suazilândia é governada pela família do rei Mswati III há mais de um século (mesmo antes da independência do Reino Unido, nos anos 1960). Contudo, deve-se compreender que o pequenino país com pouco mais de um milhão de habitantes vive de acordo com tradições tribais e que o governo de uma família real provavelmente é pouco ou sequer questionado (aliás, fica a sugestão de procurar uma foto do pai de Mswati, o rei Sobhuza II).

Como todo bom absolutista, Mswati tem o poder de admitir e demitir desde simples integrantes do Parlamento ao próprio Primeiro-Ministro, reduzir e aumentar os poderes destes e também do Judiciário, entre outras falhas administrativas. Popular e respeitado em seu país, Mswati mantém seu luxo aos custos do povo, em um dos países mais pobres do mundo e de maior desigualdade social. Polígamo, tem catorze esposas e vinte e quatro filhos e, anualmente, promove um festival onde dezenas de milhares de menores virgens são levadas a um estádio e ele acaba por tomar uma delas – independente do aval dos pais – por esposa.

Yoweri Museveni (Uganda) – 1986
Eis aqui um caso ambíguo. Uganda sofreu com a ditadura do sanguinário Idi Amin, de 1971 a 1979, indubitavelmente um membro do top10 dos piores ditadores da história africana (aproveito para recomendar o filme “O último rei da Escócia”, que se passa na Uganda de Idi Amin). Museveni era oposicionista nessa época e integrou o movimento que libertou Uganda do jugo do tirano genocida. Contudo, o governo seguinte devolveu a presidência a Milton Obote, que havia sido tirado do poder por Idi Amin. O segundo mandato de Obote, porém, foi marcado por dura repressão, inúmeras mortes e tudo o que o povo estava cansado de ver. Em 1986, após praticar, com seus partidários, a guerrilha de pântano que marcaria época, a oposição toma a capital, Kampala, e põe Museveni no poder.

Apesar de um governo eficaz – dadas as circunstâncias – que diminuiu mortalidade infantil, índice de pessoas infectadas com HIV, praticamente dobrou o número de crianças nas escolas, a gestão de Museveni também é conhecida por repressão violenta, corrupção, constitucionalização da pena de morte, pela manutenção da guerra contra a República Democrática do Congo, pela emenda constitucional (?) de 2006 que não determina um limite para o mandato presidencial, entre outros. No último 25 de janeiro, completou 25 anos de mandato.

Hun Sen (Camboja) – 1985
Hun Sen fugiu do Camboja no final década de 1970, expulso por membros do Khmer Rouge, partido do qual ele mesmo fazia parte e que agora ditava o país. Em 1979, tropas do Vietnã invadem o vizinho Camboja e derrubam o governo, colocando Hun Sen no cargo de Ministro das Relações Exteriores. Em 1985, lhe é conferido o cargo de Primeiro-Ministro. De 1993 a 1998, fica com o cargo de Segundo Primeiro-Ministro, deixando o cargo de Primeiro Primeiro-Ministro (esvaziado de poder, diga-se de passagem) com o príncipe Norodom Ranariddh. Em 1997, durante seu mandato, a oposição começa a se articular, mas Hun Sen executa um golpe de Estado, tornando-se, a partir de 1998, o único Primeiro-Ministro do Camboja. Após as eleições de 2003, nenhum partido conseguiu a maioria absoluta, fazendo-se necessária a criação de coalizões… Que mantiveram Hun Sen no cargo.

Desde a década de 1980, organizações como, por exemplo, a Anistia Internacional, apontam o Camboja como local de torturas e assassinatos de opositores. Além disso, a gestão de Hun Sen é uma das mais corruptas da atualidade, aproveitando-se da receita gerada pelo petróleo e pelos recursos minerais cambojanos, de acordo com a ONG Global Witness.

Denis Sassou-Nguesso (Congo) – 1979-92; 1997
O marxista Nguesso é um caso ímpar. Talvez até primo. Ele comandou seu país uma vez, foi retirado do cargo por via eleitoral e conseguiu a reeleição. Analisando a situação isoladamente sob o prisma eleitoral, pode-se dizer que é o menos “ditador”. O general congolês tomou o poder em 1979 através de um golpe de Estado e trouxe à República do Congo empresas francesas e estadunidenses visando melhorias na extração mineral no país. Em 1981, viajou a Moscou e assinou um acordo – que virou história – de 25 anos com a União Soviética, o que demonstrava seus ideais comunistas.

A partir de 1989, sob as ruínas do mundo soviético, Nguesso, pressionado pela França, reduziu o controle estatal na economia, libertou um punhado de presos políticos e anunciou que ali começava um período de transição para o capitalismo em seu país. Em 1992, após o desmoronamento do mundo comunista, com o fim da URSS, Nguesso não conseguiu convencer a população de que seu governo seria capaz de efetuar a transição, e ficou apenas em terceiro lugar, com 17% nas eleições daquele ano. Curiosamente, foi eleito em 1997 e reeleito em 2004. Além do golpe militar, o governo deste comunista africano parece não ter feito nada de errado, não fosse uma série de fatores, como as prisões de opositores, a repressão, a violência, a economia fraca (apesar de ser um dos maiores produtores de petróleo da África Subsaariana), o fato de sete a cada dez congoleses viver na pobreza…

Paul Biya (Camarões) – 1982
Qualquer busca na Internet acerca de Paul Biya relatará que este político camaronês realiza periodicamente eleições evidentemente fraudulentas para “legitimar” seu poder. Não obstante estar no poder há mais de 28 anos, o senhor Biya, por mera e pura vontade própria, adicionou uma emenda à Consituição, em 2008, permitindo que concorresse a mais um mandato (em Camarões, o mandato presidencial é fixado em sete anos) nas eleições de outubro deste ano.

Como todo bom viajante, Biya adora passar períodos no hotel InterContinental de Genebra, na Suíça, por períodos que variam de duas semanas a três meses. Afinal, ele merece… Um homem que há quase três décadas dita um país que está na invejável 131ª posição no ranking de IDH e é marcado por acentuada desigualdade social precisa de um tempinho para si, não é mesmo?

Abaixo, o mapa utilizado no último post, destacando também os países dos ditadores mencionados neste post, em vinho.

No próximo post, a categoria final: homens que comandam seus países há mais de três décadas. Homens que debateram com Bush pai e Bush filho, que dariam calafrios em Stalin, que perseguiriam Mao. E nada disso é bom.

A música de hoje é “We Weren’t Born To Follow”, do clássico Bon Jovi.

Ditadores da atualidade – parte 1

Poder não é autoridade – e a recíproca é verdadeira. Autoridade é comandar e gerenciar de modo a demonstrar respeito, sem usar métodos abusivos para a realização de tarefas ou acatação de ideias. Poder é o contrário. Apesar de parecer óbvio qual a opção ideal, há fatores que determinam o que determinada pessoa vai escolher.

Um exemplo típico é quando um governante se deixa levar pela ânsia pelo poder. Algo que me intriga é como pessoas assim têm sossego, paz. Enfim, o que vou fazer, aqui no blog, é uma série breve de três posts sobre ditadores que começaram 2011 no poder de seus respectivos países.

Os posts serão divididos em três categorias: ditadores que estão há até 20 anos no poder, entre 20 e 30 e há mais de 30. Antes de começar, gostaria de deixar claro que não vou contar como ditadores os partidos que governam um país há bastante tempo, pois, apesar disso, há mudança de governante. Mas exemplos consideráveis disso, que ficam como sugestões, são o Partido Democrático (e irônico, por que não?) do Turcomenistão, no comando desde 1991; o Partido Comunista do Vietnã, que, no formato atual, se estabeleceu em 1976; e o Partido Revolucionário Lao (do Laos), que revoluciona a ditadura no país desde 1975; o Partido Comunista Chinês, no comando desde 1949… O objetivo, aqui, é falar de caras-de-pau que se mantêm no poder de seus países, estampando o mesmo belo rosto no noticiário internacional há anos, sem sequer dar a entender que se importam com seus respectivos povos.

Hoje, vou falar de ditadores que estão há, no máximo, 20 míseros anos no poder – o que não significa necessariamente anos no cargo ocupado. Os ditadores serão ranqueados (em cada postagem), de maneira decrescente, de acordo com o ano em que entraram no poder. Enfim, vamos ao que interessa.

Hamid Karzai (Afeganistão) – 2001
Após a expulsão dos Talibãs do poder – mas não do território – afegão, Hamid Karzai, em conferência na Alemanha, em dezembro de 2001, foi escolhido por políticos de seu país como líder provisório por seis meses. Depois, foi nomeado presidente interino por dois anos. O tempo o conduziu às eleições de 2004, onde venceu. Após um governo frustrante, do qual esperava-se melhorias e reformas, candidatou-se às eleições de 2009. Neste pleito, recorreu à clássica fraude eleitoral (elemento que se mostrará muito frequente na leitura de quem continuar os posts desta série), mas, claro, sem reconhecê-lo. O candidato da oposição, Abdullah Abdullah, declarou desistir das eleições e, por falta de outros concorrentes, Karzai foi declarado vencedor. Um ditador que já deu seus primeiros passos.

Abdoulaye Wade (Senegal) – 2000
Presidente do Partido Democrático Senegalês desde 1974 e candidato da oposição à presidência desde 1978, Wade finalmente foi eleito em segundo turno, após ficar em segundo lugar no primeiro turno das eleições de 2000. E pelo visto, Abdoulaye Wade parece ser o tipo de homem que gosta de mudanças – em seu favor, naturalmente. Após vencer as eleições de 2007 já no primeiro turno (levante uma sobrancelha), ele não se contentou com o extraordinário mandato de seis anos nem com sua reeleição e, em setembro de 2009, mexeu seus pauzinhos para que a Constituição lhe desse aval para concorrer à presidência em 2012, segundo suas palavras, “se Deus me der uma vida longa”. Wade, esse homem de cara fechada na foto, se tivesse orkut ou facebook, teria fotos com nosso ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim e com o ex-presidente Lula.

Abdelaziz Bouteflika (Argélia) – 1999
Curiosamente nascido onde hoje é uma cidade do Marrocos, o presidente argelino desde 27 de abril de 1999 é do tipo mais comum de ditador: militares – ou camaradas dos militares. Bouteflika rejeitou apoio do exército para concorrer às eleições de 1994, mas, quando o então presidente (e general) Liamine Zéroual resolveu antecipar as eleições de 1999, Bouteflika aceitou apoio militar sem pestanejar (porque agora, sim, as forças armadas lhe prometeram amplo controle sobre elas e outras áreas) e concorreu de forma independente. O resultado? Magicamente sucedeu um presidente militar ao ter o apoio das forças armadas, com míseros 94% dos votos, numa eleição evidentemente fraudulenta. Apesar de sua queda em popularidade e aprovações duvidosas de referendos sobre assuntos nacionais, Bouteflika foi reeleito com 85% dos votos nas eleições de 2004. Durante seu segundo mandato, adquiriu câncer estomacal e um outro sintoma do excesso de poder: um adendo na Constituição, que versa sobre a possibilidade de concorrer inúmeras vezes à presidência e aumentou os poderes presidenciais, foi aprovado – mas sem a consulta ao povo – e nosso querido Bouteflika não só concorreu às eleições de 2009 como as venceu com 90,24% dos votos, a despeito de tentativas de boicote da oposição. Após os protestos árabes do final de 2010 e do começo deste ano, ele baçançou, mas se mantém no poder.

Hugo Chávez (Venezuela) – 1999
Uma figura militar famosa em seu país por décadas, Chávez chegou a elaborar um golpe militar, mesmo com apoio não muito numeroso de militares e várias traições dos poucos que o apoiavam, chamado Operação Zamora, em 1992. A operação falhou. Chávez e partidários foram presos pelo segundo mandato do corrupto e ineficaz governo de Carlos Pérez (1989-93) – Pérez também fora presidente entre 1974 e 1979. Libertado em 1994 pelo novo presidente, Hugo Chávez passou a militar por toda a América Latina, enchendo a boca para conclamar os ideais “bolivarianos”, algo como um mix de comunismo, nacionalismo e ditadura.

Em 1998, venceu as eleições em primeiro turno e em 1999 aprovou uma nova Constituição – que previa novas eleições no ano seguinte, as quais venceu com quase três quintos dos votos. A oposição a Chávez, no entanto, cresceu e chegou a derrubá-lo por 48h, em abril de 2002. Mas Chávez voltou. E com ele, a retórica populista, que garantiu vitória nas eleições de 2006. Sem se mostrar satisfeito, o presidente que, eleito em 1998, jurou perante seu povo lutar por ideais democráticos, realizou e venceu um referendo (uma moda na Venezuela Chavista) sobre a permanência indefinida no cargo de presidente. E lá está ele, hoje. A foto ao lado é de um encontro, no Palácio Presidencial de Miraflores (na Venezuela) em 2010, de Chávez (à esquerda) com o próximo ditador da lista, o bielorrusso Aleksander Lukashenko.

Aleksander Lukashenko (Bielorrússia) – 1994
Famoso por ser “o último ditador no coração da Europa”, Lukashenko (assim como seus partidários) é acusado de crimes contra os Direitos Humanos, fraudes eleitorais, violações à democracia… Eleito deputado em 1990 e, em 1994, presidente (com mais de 80% dos votos no segundo turno), se reaproximou com a Rússia, com quem seu país mantêm uma parceira chamada de “União da Rússia e Bielorrússia”, talvez num devaneio nostálgico relembrando a extinta URSS, quem sabe? Baseado em fraudes, reelegeu-se em 2001, quando prometeu melhorias sociais, como maior apoio à agricultura, mas tudo que lhe interessa, de fato, é o poder. Tanto que, milagrosamente, e apesar de oposição grave, em 2006 foi reeleito com mais de 93% dos votos – mas, como é um bom homem, orientou o governo para que este divulgasse que o resultado havia sido 86%. Um lorde, convenhamos. E quando você achava que o ateu Lukashenko, literalmente uma ilha ditatorial na Europa (a Bielorrússia também não tem saída para o mar), não poderia ter feito mais nada… Ele conseguiu vencer as eleições de 2010 com praticamente 80% dos votos, mesmo havendo nove candidatos de oposição concorrendo. Um ditador à moda antiga no continente que mais rapidamente extirpou ideais ditatoriais de si. Aliás, esse bigodinho não lhe lembra alguém?

Kim Jong-Il  (Coréia do Norte) – 1994
Em 1948, Choi Yong-kun, um exemplar militar norte-coreano, e então presidente do Partido Comunista, tornou-se comandante-em-chefe de todas as forças armadas do país, inaugurando o comunismo no lado norte da península coreana. Em 1972, Yong-kun se aposenta e o militar Kim Il-sung governa o país até sua morte, em 1994. Seu filho, o adorável (e também militar) Kim Jong-Il (foto à direita), torna-se então o “Líder Supremo da Coreia do Norte”, um cargo criado em sua administração. Aliás, a administração de Jong-Il é frequentemente acusada de violações dos Direitos Humanos, violência, opressão e a população é considerada, mundo afora, como vítima de campos de concentração, tortura, trabalhos forçados, fome, entre outras mazelas. Isso para não mencionar o fato de o país asiático ser um dos mais fechados de todo o mundo; pouco se sabe sobre o que acontece dentro dessa estufa burocrática com toques nucleares. Contudo, Kim Jong-Il está se preparando para deixar o cargo – no melhor estilo Ronaldo, ou seja, antes de perder a forma completa. Mas já é certo que seu filho mais novo, Kim Jong-un, diabético e cardíaco como o pai, e educado na Suíça, será seu sucessor. Em outras palavras, trata-se-á de uma ditadura comunista dinástica, algo inédito.

Isaias Afwerki (Eritreia) – 1993
Isaias Afwerki liderou o movimento pela independência da Eritreia da Etiópia, de 1970 até atingir seu objetivo, em 24 de maio de 1993. Desde então, instaurou um regime unipartidário, o qual lidera, após ter vencido duas eleições deploráveis. Seu país é notoriamente famoso por ser o recordista em prisões de jornalistas. Além disso, Afwerki ainda não autorizou o multipartidarismo, baniu qualquer mídia privada e vive em choque com a vizinha Etiópia, de quem seu país, ao se tornar independente, “roubou” a saída para o mar.

Em maio de 2008, Isaias Afwerki disse que adiaria as eleições um pouquinho: umas três ou quatro décadas. Segundo o pensamento do líder eritreu, “as eleições polarizam a sociedade”. Ah, e regimes ditatoriais são a mágica e melhor solução, certo?

Than Shwe (Mianmar) – 1992-2011
O primeiro de nossa lista a ter sido destituído do cargo em 2011, Than Shwe governava o talvez mais fechado país do mundo, Mianmar. No poder desde 1992, quando entrou para substituir o também general Saw Maung (que se afastou do cargo por razões médicas), Shwe é acusado de torturar opositores, prender jornalistas e restringir acesso a boa parte do território de seu paupérrimo país. Mianmar ocupa apenas a desoladora 132ª posição no ranking de IDH e, apesar de uma população estimada em não mais que 55 milhões de habitantes (o último censo oficial foi feito em 1983), o país tem o 12º maior exército disponível do planeta. Shwe, budista e o primeiro líder birmanês a visitar o santuário de Budh Gaya, na Índia, passou a ser chamado também de hipócrita após ordenar que seu governo abrisse fogo contra monges budistas, em 2007.

Contudo, a realidade triste que o país enfrentou desde 1962, quando uma junta militar tomou o poder, pode estar se esfacelando após reformas políticas ocorridas em fevereiro de 2011, que conduziram Thein Sein ao cargo de primeiro-ministro. Mas nem tudo são flores – ainda. Isso porque Shwe chefiará o Conselho Supremo de Estado, com oito membros, que não é previsto na Constituição. Como costuma ocorrer, certos ditadores teimam em largar o osso. Shwe também figura na lista de ditadores com câncer – o seu é intestinal -, além de ser diabético.

Meles Zenawi (Etiópia) – 1991
Conhecido pela duríssima repressão, o governo de Meles Zenawi pode ser chamado, sem muita margem de erro, como um dos mais violentos, também. Zenawi era o líder da oposição ao regime anteriormente em vigor no país e assumiu a presidência interina do país após a derrubada do regime anterior, do Derg, uma junta militar comunista que comandava o país.

Zenawi foi eleito primeiro-ministro em 1995 e reeleito em 2000, 2005 e, mais recentemente, no ano passado. Contudo, eleições, na Etiópia, são verdadeiros caos. Não pelo povo, claro, mas pelas forças do governo, que promove atrocidades contra a população. Isso para não mencionar as perseguições étnicas no território etíope. A gestão de Zenawi viu a separação da Eritreia – após cerca de trinta anos de guerra – e a consequente perda de saída para o mar. Aliás, uma curiosidade: o nome verdadeiro do ditador é Legesse; “Meles” é um pseudônimo.

Confira, no mapa (clique para ampliar), a localização dos países dos ditadores citados hoje.

No próximo post, ditadores que estão há mais de 20 e há menos de 30 anos no comando de seus desafortunados países.

A recomendação musical de hoje é “Everchanging”, da banda Rise Against.